PDA/MATOPIBA:
MATA O CERRADO E SEUS POVOS
Nas ruas de Palmas - TO, manifestantes com cartaz contra o PDA/Matopiba.(foto: Antonio Veríssimo.
Junho de 2016)
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Quando as últimas
árvores do Cerrado caírem; quando as nascentes e os rios limpos que ainda
restam estiverem agonizando; quando os animais e as espécies de vida desta
região estiverem se debatendo desesperadamente em meio à contaminação da terra,
da água e do ar; quando o sol esturricar a face da Terra; então, todas as
formas de vida estarão condenadas. E só então nossos gritos de alerta bradados
hoje para que toda essa calamidade seja evitada serão lembrados. Mas, será
tarde. Alguns poucos humanos inescrupulosos, movidos por uma ganância
ilimitada, terão decretado o fim da vida nesta nossa Casa Comum. Eles mesmos também
morrerão se debatendo em suas vidas de opulência e privilégios. No entanto, será
tarde. Nossos gritos de alerta terão sido sufocados. Quem viver verá.
Para resistirmos a este
processo destruidor de toda espécie de vida, é preciso que nossa sabedoria
ancestral indígena, assim como os conhecimentos tradicionais das comunidades e dos
povos das florestas, sejam respeitados e valorizados. Nossa voz e nosso grito devem
ser somados aos dos cientistas, pesquisadores e amantes do Planeta Terra, nossa
Casa Comum - como nos convocam o Papa Francisco e tantas pessoas que fazem esse
anúncio de vitória da Vida.
É por isso que nós,
povos indígenas Apinajé, Krahô, Xerente, Karajá de Xambioá, Krahô-Kanela, Kanela
do Tocantins, Avá-Canoeiro e Javaé, de Tocantins, Tapuia, de Goiás, Kayapó do
Para, Guarani Kaiowá do Mato Grosso do
Sul, e Pataxó Hã-Hã-Hãe, da Bahia, juntamente com as comunidades tradicionais,
entre elas as Quebradeiras de Coco, os Quilombolas, Ribeirinhos e Camponeses e
as Pastorais Sociais, nos manifestamos dizendo “NÃO” ao Plano de
Desenvolvimento Agrário (PDA) MATOPIBA, que é um projeto de destruição e morte
do Cerrado e dos seus povos em áreas do Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia.
Este projeto é o mais
recente de uma série de outros, que vêm sendo implementados há décadas neste
bioma, na perspectiva de imposição de uma lógica desenvolvimentista que
privilegia o agronegócio e a exportação de commodities. Programas como o
Prodecer I, II e III e os projetos Campos Lindos e Formoso foram desdobramentos
de um projeto em parceria com a Agência de Cooperação Internacional do Japão
(cuja sigla da sua denominação em inglês é Jica), elaborado por técnicos em
nome de empresas e do governo do Japão com o objetivo de explorar o Cerrado
para favorecer este país no comércio internacional de grãos. Em 40 anos, o
resultado foi o aumento do desmatamento em mais de 70% da cobertura vegetal e a
compactação e o envenenamento dos solos, provocando a diminuição das chuvas,
que já não recuperam os aquíferos e, consequentemente, a seca das nascentes dos
córregos e rios, ameaçando gravemente a soberania hídrica e alimentar dos povos.
Queremos igualmente
dizer “NÃO” aos mega projetos de infraestrutura, como as hidrelétricas,
hidrovias, estradas; e do agronegócio, como as monoculturas, as irrigações, a
utilização massiva de agrotóxicos, a apropriação privada das sementes. Todos
concorrem para o mesmo processo de destruição e morte. Repudiamos a construção
das usinas hidrelétricas Serra Quebrada, Santa Isabel, Perdida II, e Marabá e da
hidrovia Araguaia/Tocantins.
Diante deste cenário
desolador, queremos contribuir com a construção de uma nova sociedade,
respeitadora da Mãe Terra e da harmonia na convivência com todas as formas de
vida. Queremos oferecer nossa sabedoria e conhecimentos e nossos projetos de
Bem Viver.
Diante do exposto, exigimos:
Manifestações dos povos indígenas, quilombolas e camponesa contra o PDA/Matopiba nas ruas de Palmas - TO. (foto: Antonio Veríssimo. Junho de 2016 |
1. A conclusão o quanto antes os processos
de demarcação das nossas terras tradicionais: Taego Ãwa, do povo Avá Canoeiro;
a terra dos Kanela do Tocantins; a conclusão da demarcação da terra indígena
dos Krahô-Kanela; e a Apinajé II/Gameleira, do povo Apinajé e do povo Krahô da
aldeia Takaywrá;
2.
A conclusão da revisão de limites do
território do Carretão do povo Tapuia de Goiás;
3. A
imediata demarcação, desintrução e proteção da Terra Indígena Taego Awa,
do povo Ava-Canoeiro;
4.
Que o Congresso Nacional arquive a
Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 215; o Projeto de Lei 1610, que abre as
terras indígenas para a exploração da mineração, dentre outros que buscam
retirar nossos direitos constitucionais;
5.
Que o Congresso Nacional arquive a PEC 65/2012,
que flexibiliza o licenciamento ambiental. Repudiamos as manobras que colocam
os interesses do agronegócio e do latifúndio acima da Vida e desrespeitam a Constituição
Federal, que no seu artigo 225 garante o direito a ter um meio ambiente
saudável para todos;
6.
que sejam realizadas Audiências Públicas
para debater o PDA/MATOPIBA e os possíveis impactos e interferências deste
programa no bioma Cerrado e nos territórios indígenas, quilombolas e nas demais
comunidades camponesas e rurais, e que seja garantida ampla participação destes
movimentos
7. Que
o governo federal cancele o programa PDA-MATOPIBA e os órgãos competentes
embarguem todos os projetos em andamento nos estados do MA, TO, PI e BA.
8.
Exigimos o cumprimento da legislação
brasileira e internacional, por exemplo, os Estudos e Relatórios de Impacto
Ambiental (EIA/Rima) e a Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho
(OIT), em relação a todos os projetos considerados impactantes, que envolvem
desmatamento, uso de agrotóxicos, hidrelétricas, mineração, indústria
madeireira, hidrovias e qualquer alteração nos nossos modos de vida
tradicionais;
9.
Que seja realizado (com urgência) o
julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADIN) 5312 do Projeto de
Lei (PL) estadual 2.713/2013, que dispensa o licenciamento ambiental das
atividades agrossilvipastoris, que integram lavoura, pecuária e floresta,
empreendimentos impactantes do agronegócio;
10. Que
o Ministro Teori Zavascki do Supremo Tribunal Federal relator da ADI 5312
julgue a Liminar que questiona a Lei 2713/2013 do Estado do Tocantins.
11. Conforme
preconiza os Art. 231 e 232 da CF exigimos que seja efetivada com urgência
a Fiscalização e Proteção dos Territórios Indígenas literalmente
abandonadas pelo Estado brasileiro;
12. Que
seja feita auditoria no Distrito Especial de Saúde Indígena (DSEI) de Tocantins.
13. Exigimos
também a melhoria na atenção à saúde indígena dos povos indígenas de Goiás e
Tocantins, e seja respeitada a nossa relação com os nossos familiares
falecidos, sem que, seja rompido o vínculo com seu povo, respeitando nossa
diversidade cultural;
14. Que
seja abandonada de uma vez por todas a criação do Instituto Nacional de Saúde
Indígena (INSI), que significa a privatização da saúde indígena e o fim do
controle social da Política de Atenção à Saúde Indígena;
15. Exigimos que a SEDUC respeite o nosso direito
à uma educação diferencia e de qualidade respeitando a forma organizacional e
cultural de cada povo indígena e que sejam cumpridas todas as nossas demandas
na melhoria da educação escolar indígena;
16. Que
a Universidade Federal do Tocantins (UFT) explique como foi firmado o convênio
com o PDA MATOPIBA, através do qual foi criado um Instituto do Matopiba na UFT.
Queremos saber: “quais são as bases deste acordo?” e “como esse convênio e este
instituto vão ajudar a proteger o Cerrado e os territórios indígenas,
quilombolas e das comunidades tradicionais?”;
Repudiamos
veementemente a atitude desrespeitosa com os povos indígenas da senhora
Ivanezilha Ferreira Noleto, coordenadora do DSEI-TO, por não ter comparecido à
III Assembleia dos Povos Indígenas de Goiás e Tocantins, e por ter enviado uma
equipe totalmente despreparada que não tem nenhum poder e autonomia para
resolver as nossas demandas e denúncias
da precariedade da saúde indígena;
Exigimos também uma
rigorosa apuração e a punição dos assassinos das nossas lideranças.
Responsabilizamos o Estado brasileiro pelo processo de violência e genocídio
contra as lideranças indígenas do Mato Grosso do Sul, em especial os Guarani e
Kaiowá. A impunidade significa um estímulo ao massacre dos nossos povos.
Por fim, nós, os mais
de seiscentos participantes da III Assembleia dos Povos Indígenas de Goiás e
Tocantins, realizada em Palmas (TO), entre os dias 20 e 23 de junho de 2016,
conclamamos a sociedade brasileira para lutar conosco na defesa dos direitos
indígenas duramente conquistados na última Constituição Federal de 1988, em
defesa da Vida do planeta Terra e pela construção de uma sociedade justa,
democrática e plural.
Povos Indígenas de
Goiás e Tocantins
Povo Pataxó Hã-Hã-Hãe -
BA
Povo Guarani Kaiowa -
MS
Povo Kayapó -PA
Palmas, 23 de
junho de 2016.